Sair de Sárria, foi por locais que beiravam a linha férrea. Era dia 26 de maio, e como todas as etapas , cada uma se manifesta de alguma forma diferenciada da outra. Descer da parte alta da cidade e ir chegar até a base dos trilhos do trem e esgueirar por estas paragens , em direção a uma subida contínua por mais de 15 km ininterruptos. Todas as passagens eram por regiões de bosques, floridos, arvores, arbustos rasteiros, mais altos, mas sempre na direção de pequenos povoados inexpressivos em tamanho, e cultivando a característica de produtores rurais, seja por carne, leite, ovelha, ou até plantações menores de subsistência. A atmosfera do campo presente 100 %, com suas particularidades, seus cheiros ( estábulos confinados, cana fermentada, silagem de alimentos, feno seco) e por ai vai. O dia era de DOMINGO, e a temperatura era adequada, mas com uma névoa, que nunca deixava o sol sair e nunca chovia também. Um domingo nebuloso, que nos acarretava muito suor, na subida generalizada do percurso, e também pela mesmice da paisagem, que em nada diferenciava de algumas já vistas e conhecidas. Um tanto monótono o nosso domingo, fato este que somado ao término dos dias e a chegada iminente dentro de três dias a aumentava a sensação de fim de festa e com algumas horas de sensação de tomara que termine. Isso é normal, e pelo que li sobre e por relatos de mais parceiros, a sensação é semelhante por diversas apreciações.
O relevo mostrado pelo gráfico, de Sárria ate Portomarim, mostra uma subida cheia de escarpas e de uma dificuldade relativa, tendo em vista que depois da metade do trecho a subida foi íngreme também, acarretando um desconforto bem chatinho. Importante salientar, que o final do percurso, vai escasseando mesmo de paisagens de diferentes sensações, ficando o peregrino muito introspectivo com suas experiências anteriores e com as sensações experimentadas, talvez pelo explêndor de algumas situações e o sentimento de finalização do " sonho".
A chegada em Portomarim, nos levou a algumas surpresas positivas, pois a visão da entrada da cidade é por uma ponte gigante, que nos faz divisar o rio imenso de águas pretas e de certa forma fundas, que escondem as ruínas de uma cidade anteriormente construída as suas margens, que de alguma forma em função de o rompimento de uma barragem em anos antigos, destruiu literalmente a cidade , fazendo com que a mesma fosse reconstruída em cima do morro e refeita em bases solidas, tendo o rio lá embaixo como pano de paisagem ao fundo e em baixo.
Uma imensa ponte, com passagem paralela para pedestres e peregrinos, que nos faz divisar no alto a nova cidade, e nas margens do rio os resquícios da cidade destruída pelas águas. A chegada na parte alta da cidade, reserva de forma irônica e até cruel a subida de mais de 100 degraus na escada emblemática da entrada, ocasionando uma última descarga de energia, até chegarmos as acomodações do albergue. De tirar o couro do peregrino, na melhor das falas , os degraus da igreja, na derradeira chegada, depois de toda a quilometragem feita pelo peregrino caminhante.
A chegada no albergue da " XUNTA" como dizem os galegos, é de uma satisfação muito grande, pois a cidade tem mais ou menos 2 mil pessoas, com diversos pontos de gastronomia, pousadas, hostels, que se contrastam com a significativa imponência do albergue público. Os albergues da galícia, foram todos reformados, aumentados, inaugurados durante as comemorações do ano Jacobeo em 2010, e são muito atuais, organizados, dotados de equipamentos modernos, mas com uma falha que eu e a Simone destacamos em quase seis ou sete paradas. Eles tinham cozinhas maravilhosas com todos os equipamentos modernos, etc...., mas acredito que de forma de acerto comercial com o comércio da cidade, não dispunham de pratos, talheres, panelas, copos( e por ai vai), contrastando com enormes geladeiras industriais, fogões elétricos, maquinas de lavanderia, maquinas de produtos, refrigerantes e tudo o que normalmente precisamos. Um contraste econômico, que não acredito ser do conhecimento das autoridades da galícia, pois são manobras locais que destoam do espirito peregrino encontrado em todas as paradas que se faz durante o caminho. Como usar uma cozinha moderna e completa, sem panelas, copos, talheres e pratos? RESPOSTA: NINGUÉM COZINHA E TODOS COMEM NOS RESTAURANTES ! Rssss, segredo revelado.
Nada que tire o brilho do caminho, mas são constatações. Constatações que fizemos também com relação aos asiáticos que percorrem os caminhos, e que usam em suas rotinas , alguns remédios milagrosos, tipo a bolina verde que o parceiro MARCOS, um brasileiro que estava caído de uma entorse no joelho, e que medicado que foi por uma peregrina Coreana, tendo quase ressuscitado e continuado a caminhar depois de dias de sofrimento. Uma bolinha verde milagrosa ! Nestas paradas, algumas lições e constatações : nosso amigo francês desapareceu das etapas; a sempre presença de uma peregrina alemã ( Elisabete), que desfrutou conosco cerejas em fruta numa sentada no refeitório; os meninos coreanos que já caminhávamos juntos por vários dias, coisas que fazem sentido, por menor que seja o contato, mas que nos fortalecem, nem que seja pelo " hai" dito nas cruzadas, já que as dificuldades da língua nos impossibilitavam de mais.
Uma constatação na GALÍCIA: A diferenciação em qualidade ( a menor) da sinalização do caminho. A área da Galicia está muito defasada no cuidado da sinalização do caminho de santiago, se baseando somente nos marcos de pedra com as quilometragens decrescentes e nada mais. Inclusive permitindo sinalizações paralelas que estavam levando peregrinos a serem induzidos a fazerem voltas alternativas, por interesse de algum comercio que sinalizava errado para que as pessoas passassem por seus comércios. Uma situação desagradável e que acredito que necessitasse de um cuidado especial e um rigor maior, para que isso não deturpe o espírito do caminho. Fazer roteiro alternativo para passar na frente do comércio de a, ou b, é uma situação extremamente desagradável. A diferença do tratamento e da estrutura na região da NAVARRA, em relação ao tratamento da GALÍCIA, e de uma diferença enorme e significativa. Constatações do caminho.