Um dia muito bem,e pode no outro um dia muito mal. O caminho nos proporciona isso com a maior facilidade e com a naturalidade de um dia de sol que chove ou um dia de chuva que abre um sol lindo. Fácil e rápido, assim num piscar de olhos.
Acordamos as 5:30 da manhã, com uma noite bem dormida, com a alegria e o bom astral de ter conhecido gente boa, ter sido acolhido com bastante carinho, e reiniciar o caminho com bastante animo e vontade cumprir a etapa determinada para o dia. Colocamos o pé na estrada noite fechada ainda,sem lanterna, porque já tinha descartado a minha e nos baseamos pelas luzes da cidade em sua saída ate a beira da ponte que encontramos, e por mais incrível que possa parecer, erramos o caminho ( sem eu saber) e me embrenhei por uma estrada que estranhei não ver sinalizações e caminhei por 30 minutos em direção ao desconhecido errado, chegando a uma ponta de morro que não tinha saída, confirmando que estávamos errados mesmo. Que sensação desconcertante, chata, irritante, gastar ao todo uma hora de energia boa, na primeira hora da manhã, fresquinho, caminhando em direção errada, e voltar ao ponto inicial, vendo que o lugar onde erramos, foi por ter passado no escuro por uma marca de pintura no asfalto que indicava o lado da ponte e o rumo totalmente diferente do que tínhamos optado. Um erro primário, chato, que entornou nosso dia, e que nos fez, em todos os demais dias, não sair mais no escuro, evitando que novamente pudéssemos ter um caminho errado de novo. Nunca caminhe muito se não encontrar de 500 em 500 metros, mais ou menos sem ver um sinal, uma pintura, uma flecha, um marco, um risco na arvore etc....que são as manifestações de rumo mais conhecidos do caminho.
Como sempre na vida e na realidade dos fatos, aprendemos de muitas maneiras, e a nossa primeira experiência de caminho errado, nos abateu bastante. O caminho do dia em seu trajeto, era terrível, somente pelo meio de plantações de pínus e eucalíptus, com ausência total e geral de gente, somento com o som desconcertante do pássaro chamado " cuco", que por mais de 17 km de caminhada , era o único som que ouvíamos e nos distraía.
Pois dizem que o que é ruim pode ainda piorar, e tivemos a oportunidade de vivenciar na prática este dito popular, que na integra, aconteceu conosco. Tinhamos a referencia de São joão de Ortega, como o local onde havia um padre extremamente hospitaleiro, e que promovia um encontro todo especial aos peregrinos, com a sua famosa sopa de alho, que em todos os livros que li, era referenciada como um acontecimento. E nós, como talvez todos os peregrinos que tinham referenciais de leituras, também esperavam por esta hospitalidade e por esta parada diferenciada nesta parte do trajeto, tendo em vista que havíamos sido brindados com um caminho ruim, terra inóspita, longa, cansativa, sem atrativos, no meio de uma mata vulgar e diferenciada dos caminhos arborizados que já tínhamos passado.
Pois a triste surpresa que tivemos ao chegar, foi de que o Padre famoso por sua hospitalidade e cuidado com esta parada, havia morrido já fazia dois anos, e as marcas evidentes de decomposição do local e o estado lastimável desta parada, foram logo detectados. UM local ermo, somente com um restaurante, totalmente deturpado pela realidade que o local era uma parada obrigatória, sem cuidados maiores, com instalações sujas, sem trato, banheiro ruim, com aspecto de desleixo e muito triste. Que parada ruim e que resto de dia e noite. A Simone entrou no banheiro e se apavorou, sendo que as próprias camas eram despojadas de cuidado, fazendo um quadro muito chato e obrigatório.A opção mais próxima eram mais 6 km, e começava a garoar, fazendo com que ninguém quisesse arriscar o próximo povoado. ( Como em nossa vidas, se soubéssemos como seria o nosso dia seguinte), e eu e a Simone entenderíamos no dia seguinte uma série de fatos e motivos que nos chegaram como talvez, lição, mostra, nem sei direito como definir o que no outro dia para nós aconteceria. Mas a certeza, de forma triste e como recordação, que São João de Ortega, seria para nosso imaginário um local para ser esquecido, e depois eleito como a pior parada, e a pior estada que tivemos ao longo de nosso caminho .
Triste, mas dormimos mal, comemos mal, a atmosfera do lugar era ruim, as condições ruins, o acolhimento não existia e isso tudo com certeza a gente assimila e nos puxa para baixo, no ânimo e no estado de espirito. O Papo então seria dormir, acordar logo e sumir daquele lugar o mais rápido que pudéssemos. E foi o que fizemos, para amanhecer e colocar o pé na estrada logo logo. Triste lembrança de um lugar tão reverenciado e que está sucumbindo pela falta de acolhimento, cuidado, estrutura e total ausência do espírito fraterno do caminho. ASSIM COMO NA VIDA, ENTENDEMOS ! Virar a página era o que se impunha. QUE venha o novo dia !